Divórcio

Quando o casamento desmorona, de quem é a culpa? É minha? É do outro?

Lilian Marx Flor
Psicóloga

A dor toma conta. A dor da frustração, do fracasso. A dor de sentir que todo o esforço, todo o empenho, toda a paciência… tudo foi em vão. Não deu certo. E não há mais o que fazer; esgotaram-se as possibilidades. Todos os sonhos de um casamento feliz desmoronaram.

Nessa tristeza, o cristão, que fez os seus votos matrimoniais com toda a sinceridade e colocou tanta disposição na tentativa de superar as dificuldades e levar adiante a ideia da família unida, dobra os joelhos, no mais profundo desespero, e clama: “Senhor, o que eu faço?” É legítimo eu me separar? Posso fazer isso sem me afundar no sentimento de culpa?

Essa questão é tão complexa, que foi utilizada pelos fariseus para colocar Jesus à prova. O que Jesus diria?

“Se você se comprometeu, azar o seu; continue casado, mesmo que isso seja prejudicial à sua vida”?

Ou ele diria:

“Se você é inocente, é legítimo se divorciar; você não tem culpa nenhuma!”?

Admitiria Jesus que o plano de Deus era falho?

O que disse Jesus?

Em primeiro lugar, Jesus confirmou o plano de Deus de forma muito clara. Ele disse: Deus instituiu, sim, o matrimônio, e ninguém pode separar o que foi unido por Deus (Mt 19.6). O casamento é uma instituição sagrada. Foi planejada por Deus, para ajudar homem e mulher a viverem felizes na terra e construírem uma família saudável. Não há erro nesse plano. É perfeito. É divino.

Depois de confirmar o plano, Jesus identificou claramente a causa do fracasso, da quebra do contrato firmado: o PECADO. Jesus explicou: “Foi por causa da dureza do coração de vocês que Moisés (A Lei) permitiu que vocês repudiassem a mulher, mas não foi assim desde o princípio” (Mt 19.8). Deus fez um plano perfeito, mas o mundo não é perfeito. Deus ensinou o homem como deveria viver para ser feliz: Não adore outros deuses, não invoque em vão o nome do Senhor, santifique o dia do descanso, honre os seus pais, não mate, não adultere, não roube, não levante falso testemunho, não cobice o que pertence ao teu próximo. Se a humanidade andasse sempre no caminho do Senhor, viveria em harmonia com ele. Mas o homem está no mundo, sujeito ao pecado. E Jesus sabe disso.

Quando o casamento desmorona, de quem é a culpa? É minha? É do outro?

Há situações que realmente fogem ao nosso controle. Há momentos em que nos deparamos com questões no casamento que não podemos contornar: violência, relação tóxica, adultério. Por mais que eu tenha tentado, percebo que não depende só de mim, do meu desejo, do meu esforço. Em algumas situações trágicas, não há mais o que fazer. Está acima das minhas possibilidades consertar algo que não tem mais conserto. O casamento é um contrato a dois. Uma promessa a dois. Com o pedido de bênção divina e, muitas vezes, com todo o meu empenho… mas é um contrato, que depende de mim e do outro. E houve uma quebra desse contrato.

Ainda assim, ficam dúvidas no coração daquele que devota a vida a Deus com todo o coração: EU prometi. Diante do altar, EU prometi. Será que tentei tudo mesmo? Será que falhei? Qual foi a minha participação no fracasso do meu casamento? O meu coração me acusa, ainda que todos à minha volta se esforcem para me deixar tranquilo, sem culpa. Porque eu conheço o meu coração e sei que houve momentos em que eu poderia ter agido de forma diferente. Será que o desfecho do conflito seria diferente se eu tivesse manejado melhor a situação? Será que esperei o suficiente, tomei as melhores decisões?

A boa notícia é que Jesus não está interessado em procurar um culpado. Ele não veio para julgar o mundo, mas para salvá-lo (Jo 12.47). Jesus conhece o pecado e o condena, mas ele ama o pecador. Apesar do seu pecado. Não importa se eu me sinto 99% vítima, 70% vítima, 50% vítima. Não importa se eu me sinto inteiramente culpado pelo fracasso do meu casamento. O perdão de Jesus é para todos os pecadores que reconhecem a sua insuficiência e acreditam no seu amor. Jesus está sempre pronto a perdoar, tanto a mim quanto ao meu (ex-)cônjuge, se o nosso coração estiver arrependido. Quando uma mulher, que pecou muito, ia ser apedrejada, Jesus não se preocupou em analisar se ela era completamente culpada ou vítima da sociedade. Ele disse: “Quem de vocês estiver sem pecado seja o primeiro a atirar uma pedra nela” (Jo 8.7). Depois, ele disse à mulher: “Também eu não a condeno; vá e não peque mais” (Jo 8.11).

Vejamos, Jesus disse: “Também eu não a condeno”. Ele não dividiu a situação entre perpetrador e vítima. Ele sabia que a mulher pecou em algum momento e precisava de perdão. O que a pessoa faz, o que a pessoa é, é o resultado de inúmeras situações vivenciadas. Muitas dessas vivências foram difíceis, até mesmo injustas, mas toda a trajetória de vida está manchada pelo pecado. O primeiro passo é saber que eu não serei condenado, porque o perdão me foi concedido por amor.

Depois de perdoar, Jesus estimula: “Vá”. Levante-se. Recomponha-se e refaça a sua vida. Não se sinta condenado à infelicidade; não se penitencie para sempre. Aceite que a situação é essa e que você está vulnerável. Peça ajuda quando precisar: dos amigos, dos parentes, da igreja, da psicologia, do CREAS (Centro de Referência Especializado de Assistência Social), da polícia… Não fique sozinho! Reconheça a sua fragilidade, a sua impotência. Nem sempre é possível dar conta sozinho de todas as situações.

Por fim, Jesus adverte: “Não peque mais”. Jesus não revogou a lei. A lei continua sendo o nosso guia, ainda que eu nunca a possa cumprir perfeitamente. Todos os relacionamentos requerem paciência, respeito, sacrifício, renúncia. É assim que Deus quer que eu viva, pelo meu próprio bem. Mas ele também me dá a dica de como continuar tentando: Ore. Estude. Aproxime-se da família da fé. Peça perdão novamente quando errar, porque você certamente vai errar de novo… e de novo.

Enfim, seria muito difícil julgar as situações que poderiam considerar legítimo o divórcio. Somente Jesus conhece o coração dos seus filhos. Só ele é capaz de decidir em que medida cada um errou, em que momento o contrato foi definitivamente quebrado e por quem. O importante é saber que, de uma forma ou outra, todos pecamos. Mesmo aqueles que conseguiram manter a relação sadia. Não há pessoa que esteja perfeitamente limpa diante de Deus; não há uma sequer. A notícia maravilhosa é que Jesus não está procurando justiça em minhas obras; Jesus quer me justificar mediante a fé! Jesus me acolhe, perdoa e revigora para que eu esteja sempre atento ao que mais importa: a vida eterna. Com todo o seu amor, Jesus cola todos os caquinhos da minha vida destroçada e me faz inteiro novamente, formoso e cheio de possibilidades. Porque é preciso estar inteiro e forte para enfrentar novos desafios. E compartilhar essa graça com os outros irmãos.

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