Como será depois da pandemia? O sociólogo norte-americano Nicholas Christakis responde que “a devassidão sexual, o desperdício econômico e a regressão da fé religiosa serão algumas das mudanças mais significativas”. Diz isso no seu novo livro, onde analisa os efeitos da pandemia na sociedade a partir de uma perspectiva histórica e projeta sobre o que pode acontecer nos próximos anos. Quem conhece a história e a natureza humana, vai dar atenção a este profeta secular, sobretudo quando ele diz que “a religiosidade vai diminuir”.
Essa também é a previsão do mestre brasileiro em linguística, Filipe Jordan, no artigo “A devassidão escancarada espera o mundo pós-pandemia”. Ele sustenta que “a moralidade – cerne responsável por fundamentar o crescimento da frágil e extrema direita – pode estar com seus dias contados diante da tirania do trágico Covid-19”. Busca exemplos no carnaval de 1919, após a gripe espanhola, que “reservou fantasias tão profanas quanto libidinosas no imaginário popular”. Ele cita o escritor Ruy Castro, no romance Metrópole à beira-mar, lançado em 2019, onde descreve a vida no Rio de Janeiro após a pandemia que matou 50 milhões de pessoas: “Nunca houve um carnaval tão obsceno e libertário”. Também lembra o escritor norte-americano Scott Fitzgerald (1896-1940), que retrata a histeria hedonista do pós-guerra e pós-pandemia.
Hedonismo – busca adoidada pelo prazer – também foi consequência histérica na vida do povo hebreu após a libertação do cativeiro egípcio. Enquanto Moisés retirava-se em quarentena no Sinai para receber de Deus os Dez Mandamentos, o povo não aguentou a demora, produziu e adorou o bezerro de ouro numa estupenda festa com aglomeração da descrença e aventurou-se sem as máscaras de proteção daquilo que lhes havia dado liberdade.
Seguindo essa tendência, e entrando no assunto sobre outro tipo de iniquidade, tudo indica que a corrupção abafada pela Lava-Jato voltará com força e poder após o fim da operação – uma quarentena contra a impunidade que durou sete anos no Brasil. Voltará com vigor porque a desonestidade é endêmica, nasce e vive na alma do ser humano. E a lei não muda, apenas reprime. E quando a lei acaba, o mal invade igual aos rejeitos no rompimento da barragem de Brumadinho. Infelizmente, é o que devemos esperar neste Brasil onde “ladrão que rouba ladrão tem cem anos de perdão”.
“A lei vem de Deus” (Rm 7.12), argumenta Paulo num assunto sobre a pandemia das pandemias – o pecado. Lembra, no entanto, que a lei não tem o poder para nos salvar, pois revela nossa maldita condição espiritual e nos condena. Por isso, então, sem desmerecer a lei tão necessária para frear a maldade no mundo e revelar nosso pecado, o apóstolo lembra que existe apenas um jeito eficaz para nos livrar da maldição da lei e controlar a maldade em nossas atitudes: “Matem os desejos deste mundo que agem em vocês” (Cl 3.5). Depois de enumerar uma lista escabrosa de tudo o que as regras não dominam por muito tempo, Paulo aponta para o segredo contra a corrupção: “Que a paz que Cristo dá dirija vocês nas suas decisões” (3.15). O apóstolo escreve isso aos colossenses num contexto parecido com a “moralidade” cristã que tanto pregam como solução para os nossos problemas sociais. Ele é enfático: “Que ninguém faça para vocês leis […] a realidade é Cristo” (2.16,17).