“Porque Deus amou o mundo de tal maneira…”. Essa história já deves conhecer. Mas, que o Deus revelado em Cristo também provou seu amor ao Rodolfo Kirchhein, é a história que pretendo te contar agora!
Linha Pratos, município de Santa Rosa. Nessa localidade, no dia 27 de setembro de 1940, o casal Frieda e Frederico vê nascer o menino, batizado em 6 de janeiro do ano seguinte, com o nome de Rodolfo. Era o quarto filho, Bruno, Helmuth e Emílio o antecederam. Anos depois, a família cresce mais um pouco com a chegada do Nelson e da Elma. Por parte de pai, Rodolfo ainda teve duas irmãs: Elza e Ilse. Somente o Nelson ainda vive (em Dourados, MS). A Ilse faleceu recentemente (13 de março).
Poucas recordações da primeira infância ainda estão vivas na memória do Rodolfo. Consegue, porém, lembrar que brincava com a palha do milho, fazendo dela um instrumento lúdico para dar vez às fantasias infantis do seu grupo de amizade. A carência dos recursos também deixou registros afetivos nas suas narrativas dos tempos remotos. Aos quatro anos, com a morte da mãe, Rodolfo, com a irmã Elma e os irmãos Emílio e Nelson, é levado a Moreira (ao Instituto Santíssima Trindade, na cidade de Três Coroas, RS, hoje interior de Gramado, RS).
“Moreira” era uma instituição que acolhia pessoas empobrecidas e desassistidas, em sua maioria órfãos e idosos. Existe até hoje! Foi fundada por Anna e August Gedrat (pastor luterano). O fato é que lá, naquele lar, Rodolfo, em companhia dos demais internos, recebe acolhimento, carinho e orientação para prosseguir na jornada confiante na graça de Deus. Através das mãos das cuidadoras, do serviço dos funcionários, dos recursos vindos de doações voluntárias, enfim, por meio de pessoas de boa vontade, Deus agia concretamente. Com suporte físico e emocional, o menino Rodolfo pôde crescer com saúde, superando os dissabores da condição humana marcada pela dor da perda da mãe e do pai, cujo falecimento soube, por acaso, 10 anos depois da última vez que o vira, ainda com quatro anos.
Pela estreita ligação do Instituto Santíssima Trindade, “Moreira”, com a Igreja Luterana – IELB, alguns adolescentes, depois do ensino fundamental, se mudavam para Porto Alegre, para o Seminário Concórdia, já ingressando a partir do colegial (Ensino Médio). Essa foi a opção do Rodolfo. Com 14 anos, faz as malas e parte para a capital do estado, sonhando em ser pastor. Dentre as recordações dessa época, conta que “os de Moreira” (cinco estudantes) tinham certas obrigações e expectativas perante os demais colegas. Talvez hoje poderíamos identificar que se tratava de um certo bullying.
Dos 10 anos de vida estudantil no Seminário, Rodolfo recorda que, no verão, os quase três meses de férias se traduziam em trabalho. Ele e os colegas eram buscados em Porto Alegre e passavam os dias na lida da lavoura e nas eventuais obras de reparos estruturais. Ele, brincando, reconhece que a rotina de “teologando era bem mais moleza” que a das férias… E, com muita emoção, comenta que, nas suas últimas férias de estudante, recebeu do diretor a incumbência de escrever um registro histórico do Instituto Santíssima Trindade. Assim, pôde deixar o trabalho braçal para ficar diante da máquina de escrever! Felizmente conquistara a habilidade de teclar sem precisar olhar para os dedos, o que facilitou a tarefa da escrita dos sermões, depois, ao longo do ministério.
Em Porto Alegre, Rodolfo amadureceu em todos os sentidos. Cresceu no conhecimento teológico e científico. Enriqueceu suas vivências na sociedade. A vida coletiva lhe oportunizou a tomada de decisões que o afetam até hoje. Para contentamento de alguns, acertou em muitas decisões, como a de se tornar um torcedor do Grêmio! Sempre com discrição, é claro. Tradição que passou aos filhos, mas não teve êxito nessa empreitada de adesão simbólica perante os netos Christian e Mathias, colorados desde o berço!! Já a outra neta, Kora, está com ele na mesma torcida…
No dia 29 de novembro de 1964, Rodolfo concluiu o curso de Teologia no Seminário Concórdia. O título o tornou apto a ser ordenado como pastor na Igreja Luterana e a receber um chamado, o primeiro, para a Comunidade Cristo, de Palmitos, SC. Para lá seguiu meses depois, mas não sozinho! Desde 4 de fevereiro de 1965, Martha Joanna Gedrat passou a caminhar ao seu lado. Seus olhos brilham ao discorrer sobre como a conheceu, logo na infância, e como mantiveram o afeto mútuo sob um pacto estratégico “secreto” por muito tempo (ao menos sob a perspectiva deles). Com a Martha, viveu 52 anos. Ela, que faleceu em maio de 2017, é, sem dúvida, outra prova evidente de que o amor divino está presente na trajetória do Rodolfo, afinal, Deus nos ama concretamente na presença e energia das pessoas que nos cercam.
Das histórias no início do ministério, além das experiências inéditas enquanto pastor, Rodolfo faz questão de rir de si mesmo com o episódio do velho Jeep Willys da Paróquia de Palmitos. Numa segunda-feira, retornando de um culto na cidade de Chapecó, SC (“ponto de pregação”), numa determinada curva, por conta de um solavanco, foi atirado para o banco ao lado com o guidão na mão. A direção do Jeep se desprendera. Soube, depois, pelo presidente da Paróquia, que o defeito do guidão do jipe já tinha aparecido outras vezes. Aquele susto o deixou indignado, corria certo risco. Não aceitou a situação. E foi compreendido. A diretoria entregou o jipe como entrada num consórcio e, por acaso, logo foram sorteados. Mas, por outro acaso, Rodolfo não pôde estrear o novo jipe nas ruas de Palmitos, pois aceitou ser transferido naquele mesmo ano para outra congregação. O sucessor pôde fazê-lo. O fato é que essa história, um tanto hilária, é mais um indicativo da verdade de que “nós dirigimos, mas Deus guia”.
Com quatro anos, Rodolfo chegou descalço e ferido emocionalmente para ser acolhido em Moreira, enquanto órfão. Já com 26 anos, retornou numa condição bem diferente de equilíbrio: como pastor chamado para a Congregação Santíssima Trindade, de Moreira – Três Coroas. Era, agora, pastor e professor daquele lar que o viu crescer! Se antes havia recebido o amor divino, agora podia ser fonte a jorrar esse amor para outras pessoas, naquele momento, talvez em condições semelhantes às que ele se encontrara décadas atrás.
Um ano depois da chegada, em 1967, nasce a primeira filha do casal: a Dagma. Para ela, Rodolfo conta até hoje que saiu correndo da escola para vê-la chegar ao mundo na cidade vizinha, Taquara. Em 1969, Martha, Rodolfo e Dagma se mudam para a cidade de Canela, por conta do chamado recebido da paróquia local, Cristo Redentor, que era integrada, também, pela congregação de Gramado, RS. Lá, a família cresce com a chegada dos filhos Augusto (1970) e William (1972).
Na Congregação São João, em Santa Rosa, RS, foi onde Rodolfo serviu como pastor, depois de Canela (saiu em 1983), até o ano de 1990. Com o apoio de mulheres e homens de “espírito voluntário”, a comunidade desenvolveu um trabalho voltado à expansão nos bairros da cidade. Nessa mesma lógica e bênção, o ministério do pastor Rodolfo seguiu para a cidade de Novo Hamburgo, RS, na CEL São Paulo.
Rodolfo, liderando pessoas de fé, dedicadas ao Reino de Deus, pôde experimentar concretamente os frutos que colhem aqueles que confiam na misericórdia divina. No dia 25 de novembro de 2004, com 40 anos de ministério, portanto, Rodolfo celebra seu último culto enquanto pastor chamado. Passa, com isso, à condição de emérito, dentre os status da IELB.
No final do ano de 2004, Martha e Rodolfo vão morar em Canela, novamente. Agora, como aposentados. Lá celebraram bodas de ouro, em 2015, rodeados de pessoas queridas. Puderam chegar aos 52 anos de matrimônio. Em Canela, Rodolfo ficou morando até fevereiro passado. Foram dias com uma rotina diferente, desafiadora, pela condição de viúvo, mas de muitas aprendizagens que brotaram das novas relações humanas e das inúmeras leituras de temas inéditos.
Foi na Linha Pratos que a história do Rodolfo teve início. Depois de oito décadas, ele retorna ao município de Santa Rosa, guiado pelo mesmo amor que o fez dar os primeiros passos naquela mesma região. Atualmente, a graça e misericórdia divina se concretizam na existência dele através do cuidado e carinho da filha Dagma e dos funcionários da Clínica Bem Viver. Em meio a convivência com outros idosos, cada um com sua trajetória e histórias singulares, uma diversidade de narrativas de superação, conquistas, afetos e dores, Rodolfo se vê, outra vez, diante de uma rotina inédita. Muita gente que desconhecia passou a fazer parte do dia a dia, especialmente um novo e querido amigo, o colorado Ottmar Bernardi, de 92 anos, colega de quarto a quem dedica, diariamente, um tempo para ler as notícias do jornal Correio do Povo. Apesar da alteração do ambiente, a misericórdia de Deus não mudou, antes, se renovou e se revela com outra “roupagem”. Através das outras pessoas, Rodolfo continua amado pelo Deus de Abrão, Isaque e Jacó, revelado em Jesus.
“Porque Deus amou o mundo de tal maneira…”. Essa história já deves conhecer. Mas, que o Deus revelado em Cristo também provou seu amor ao Rodolfo Kirchhein, é a história que tentei resumir acima. A partir desse significado, enxergo e descrevo a trajetória do meu querido e amado pai. Nos detalhes, seja de dor ou bem-estar, seja de derrotas ou conquistas, tudo é aprendizado e graça divina que se estende a todo que nele crê, seja pastor ou pessoa em qualquer outra condição, dentro ou fora de uma congregação. O que busquei destacar até aqui, é que quando temos amparo físico, emocional ou social, cabe reconhecer Deus agindo de forma mediada em nossas vidas.
Com orgulho e gratidão reconheço que meu querido pai pôde ser alvo do amor divino e se tornar instrumento e fonte desse amor para muitas outras pessoas. Que essa singela história pessoal sirva, como tantas outras, de inspiração para nos mantermos firmes nas promessas de Deus, e nos levar a confessar com o salmista: “Cantarei ao SENHOR, porquanto me tem feito muito bem” (Sl 13.6). Rodolfo, hoje, assim canta. Que possas, onde estiveres, com ele cantar também!
Augusto Kirchhein – [email protected]
Dados biográficos
Nascimento: 27/09/1940, em Santa Rosa, RS
Filho de Frieda e Frederico Kirchhein
Formatura: 29/11/1964
Ordenação: 1º/02/1965, em Palmitos, SC
Casamento: 04/02/1965 em Três Coroas, RS
Esposa: Martha Joanna Gedrat, nascida em 1º/10/1940, em Três Coroas, RS
Faleceu em 27/05/2017, em Canela, RS.
Filha de Anna Sophie Heine e August Gedrat
Filhos: Dagma, Augusto e William
Locais onde serviu
Três Passos, RS – Cristo Vive – Estágio – 1963
Porto Alegre, RS – Cristo – São Geraldo – Estágio – 1963
Palmitos, SC – Cristo – 1965-1966
Três Coroas, RS – Santíssima Trindade – Moreira 1966-1969
Canela, RS – Cristo Redentor – 1969-1983
Santa Rosa, RS – São João – 1983-1990
Novo Hamburgo, RS – São Paulo – 1990-2004
Emérito desde 25 de novembro de 2004
Mora em Santa Rosa, RS