Amor ainda existe? A dúvida acontece na era da máquina. Máquinas não desejam, não se comovem, não protestam, não cansam, não odeiam, não amam. Produtos expostos no mercado medem a felicidade dos consumidores. Dá-se ênfase a índices econômicos, cuidados com a saúde decretam o lugar, a frequência e a prática do amor. O bem-estar é avaliado pela capacidade de produzir, de consumir. Demonstrações afetivas entre funcionários favorecem ou prejudicam resultados?
Se eu não tivesse amor, seria como um címbalo que retine, canta Paulo na Primeira Carta aos Coríntios (13.1), eu seria ruidoso como o metal, indiferente como a máquina. Se me transformasse em máquina, eu não amaria, não odiaria, não me alegraria, não me conheceria, eu mesmo me condenaria a circular como coisa entre coisas. Estamos ameaçados de viver como máquinas. Rebeldes protestaram, traçam fronteiras, desentendem-se, empapam o solo de sangue, rompem vínculos. A reaproximação não acontece espontaneamente. Sem o amor do alto, desinteligências não cessam.
Amor é dádiva. O mundo é produto de um gesto de amor. Deus demonstra afeto pelo diferente, acolhe desamparados, redime desgarrados, realiza seus propósitos através de carentes. Quem ama, põe-se no caminho do conhecimento de si mesmo. De olhos levantados a Deus, sei que sou fraco, que cometo equívocos, que trilho caminhos perigosos. O reconhecimento da minha situação leva-me a me preocupar com pessoas que passam por dificuldades, ensina-me a amparar os que necessitam de ajuda, a orientar desorientados. Quem ama respeita o que é dos outros, reconhece as capacidades de outros, aplaude as realizações de outros, ajuda diferentes a realizarem o que criativamente fazem.
Reconhecemos o amor divino em passadas gerações. Reconhecimento compreende respeito, respeito vem do verbo latino respicere – olhar para trás, admiro o amor dos que me deram a vida, dos que me educaram, dos que me ensinaram a viver com meus próprios recursos. O respeito me leva a conectar o passado ao futuro. Ao amar, reconheço-me elo entre os que me precederam e os que vêm depois. O desinteresse quebra vínculos, aniquila a vida.
Combater a máquina não tem sentido. Desde a produção de alimentos, a máquina ampara os que produzem. Importa colocar a máquina a serviço do homem. O afeto dos produtores dignifica o sistema de trocas. A solidariedade aproxima carentes. Deficiências nos levam aos que têm o que não temos, oferecemos o que recebemos. Pessoas conscientes do amor vivem em amor. Amor impregna sinos, soa no bronze. Seguidores de Cristo exprimem-se através de metais. Sinos dizem as horas, convocam reuniões, anunciam tristeza, alegria, vitória. Sinos falam, despertam lembranças, ativam o corpo, dão sentido a tarefas cotidianas. O amor de que fala Paulo aproxima cônjuges, compreende o afeto que liga pais e filhos, alimenta projetos comuns. Metais e máquinas podem ser convocados para o exercício do amor.