O dragão que expele fogo acordou e já inflama a batalha da sobrevivência. É a dura realidade da inflação que consome o famigerado salário de tantos brasileiros, piora a vida da multidão desempregada e complica a situação dos endividados. Quem enfrentou as décadas de 1980 e 1990 antes do Plano Real, carrega as lesões traumáticas da queimadura inflacionária que em 1993 chegou a 2.500 por cento. Entrar no supermercado era correr contra o tempo, no terror do tique-taque que remarcava o preço das mercadorias. Lembro-me, naquela época, pastor em Uruguaiana e fazendo as compras num supermercado invadido pelos argentinos. Com o carrinho já cheio, fui atrás de outro produto e, quando voltei, meu carrinho tinha sumido. Alguém aproveitou meu esforço, enquanto eu retornei às prateleiras com os preços já remarcados. Paguei o dobro. Em oito anos, foram sete planos econômicos e quatro trocas de moedas.
Hoje o perigo é global, especialmente no preço dos alimentos. Dizem que é a pandemia da fome – escândalo que atinge o segundo maior exportador de alimentos do mundo, o Brasil. Dá para entender? Um dos motivos da nossa inflação é exatamente este, a exportação de alimentos que gera consequente diminuição da oferta interna. É a lei do mercado.
Economia, oikonomos, no grego, ou “lei da casa”, é também regra bíblica que manda trabalhar para comer e ser bom administrador. Tudo seria tranquilo se não fosse outra regra, a ganância. “O amor ao dinheiro é a raiz de todos os males”, conclui a Bíblia. Não é o dinheiro que desgraça o mundo, mas a idolatria por coisas que perdem o valor dentro do fúnebre caixão. “Ajunte riquezas no céu”, disse Jesus, “onde os ladrões não podem arrombar”. No final das contas, inflação é fruto da desvalorização do amor. E daí não tem plano econômico que resolva. A solução é o valor permanente daquele que passou fome para nos dar o pão da vida.
Num mundo onde os pobres sempre estarão conosco (João 12.8), conforme disse Jesus, é preciso tomar cuidado contra os ataques do dragão que desvalorizam o amor. Claro, nada adianta a hipocrisia de Judas, que condenou o gesto de Maria por ter jogado aos pés de Jesus um perfume que valia trezentas moedas de prata. Ele, que vendeu Jesus por trinta moedas de prata, teve a audácia de dizer: “Por que o perfume não foi vendido e o dinheiro dado aos pobres?”. É preciso dar a Jesus o que é de Jesus e, aos pobres o que é dos pobres. E assim, se o reino de Deus e a sua justiça estiverem em primeiro lugar, as coisas do reino deste mundo nunca faltarão. Isso é promessa de Jesus.
Foi o sábio quem disse que “O comerciante que armazena mantimento, esperando preço mais alto, é amaldiçoado pelo povo; mas o que põe à venda o que tem é estimado por todos” (Pv 11.26). Ou seja, o melhor retorno no mundo do mercado é a satisfação do consumidor. Além de agradar o próximo, agrada a Deus. E no final, acontece o que também diz o sábio: “Algumas pessoas gastam com generosidade e ficam cada vez mais ricas; outras são econômicas demais e acabam ficando cada vez mais pobres” (Pv 11.24). Inflação, portanto, não vem do terrível fogo do dragão, mas do coração.