A precocidade na iniciação e a manutenção de uso de substâncias psicoativas compreende situações especiais de risco aumentado à saúde. Tanto as drogas lícitas, compreendidas como substâncias de circulação restrita à dispensação sob prescrição, quanto as ilícitas, apresentam registros de aumento da prevalência de consumo. O ambiente doméstico ocupa especial espaço de cuidados com crianças e adolescentes, que compreendem população especialmente vulnerável à experimentação e manutenção de uso de substâncias psicoativas.
Diagnósticos feitos a partir de pesquisas com adolescentes têm revelado dados alarmantes sobre o consumo destas substâncias, representadas tanto por drogas lícitas, como o álcool e medicamentos psicoativos, assim como ilícitas. Dentre os índices mais preocupantes está o crescimento do consumo de álcool. Aos 16 anos de idade já é perceptível uma frequência de uso equiparada ao comportamento de uso de álcool por adultos, o que representa a ocorrência de prejuízos biológicos, psicológicos, emocionais e relacionais. Além de uma baixa idade média de precocidade de uso para o álcool (12 anos de idade), percebe-se a experimentação de bebidas alcoólicas já aos 5 anos de idade, certamente na presença de pais ou cuidadores, motivados por questões de comportamento cultural.
Em suas pesquisas realizadas entre 2012 e 2018, considerando adolescentes de 12 e 17 anos, o dr. Luís César de Castro destaca que o número daqueles que provaram bebidas alcoólicas alguma vez na vida passou de 63,1%, em 2012, para 75,6%, em 2018. Destes, 92,8% teriam usado a substância nos últimos 12 meses – o que caracteriza uma preocupante continuidade de uso. Ao analisar as diferentes idades, observa-se, por exemplo, que aos 12 anos de idade, 53% dos adolescentes já usaram álcool, sem distinção de sexo. Tanto meninas quanto meninos apresentam taxas equivalentes de experimentação e uso continuado, tanto de álcool quanto de outras substâncias como tabaco e drogas ilícitas.
Considerando aspectos biológicos, o consumo de substâncias psicoativas como o álcool pode provocar prejuízos ao desenvolvimento do córtex pré-frontal cerebral, podendo gerar dificuldades neuropsicológicas, incluindo danos cognitivos e falhas na maturidade cerebral. “Quanto mais cedo fazem uso de álcool, mais prejuízos têm e mais suscetíveis ficam à dependência. Por isso, é tão necessário combater a precocidade de uso através do fortalecimento dos ambientes escolar, social e, especialmente, familiar”, ressalta Castro.
Em particular, o consumo de álcool compreende, inclusive, um fator de risco para o ingresso na criminalidade de adolescentes com idade entre 12 e 16 anos, especialmente. A mesma substância também motiva 70% das ocorrências policiais. É comum expressarmos que tais ocorrências estão associadas à autoria de adultos. “Entretanto, o adulto que usa o álcool de forma indiscriminada é o mesmo adulto que compõe a família, que cria filhos e que é percebido como ‘exemplo’, principalmente tolerando o uso desta substância por crianças e adolescentes. Estamos fechando os olhos para um grave problema. Portanto, é preciso atentar ao modo como os pais e familiares tratam o tema dentro de casa e como se relacionam com esse tipo de substância”.
Portanto, o cuidado com os jovens e adolescentes deve ser tão grande quanto a cautela sobre as crianças, pois o nível de amadurecimento deles ainda não é suficiente para detectar os perigos das próprias ações. “Destaca-se que as pesquisas revelam a percepção de que a figura paterna (que cuida, protege, provê e educa) representa um dos mais importantes e potentes contribuintes para a proteção dos jovens e adolescentes”, afirma Castro.
Numa sociedade tão complexa, onde sofremos pressões diversas, que por vezes nos esgotam o tempo e a qualidade do nosso tempo em família, perdemos oportunidades de ouvir, explicar, dialogar.
*Prof. dr. Luís César de Castro – farmacêutico clínico
A solução começa em casa
É muito comum, no ambiente de recuperação de dependentes químicos, ouvirmos a frase: “Eu comecei quando era adolescente, bebendo álcool escondido ou aquela espuminha da cerveja do meu pai”. A grande maioria começou assim, de forma quase inocente, e busca hoje recuperação em casas como a Comunidade Terapêutica Metanoia, em Novo Hamburgo, RS.
Mas antes de chegar a esse ponto, da dependência, há muitas coisas que acontecem e que merecem a nossa atenção. Há, por muitas vezes, caminhos que levam à destruição de lares e famílias. Como bem comenta o dr. Luis César de Castro, as famílias estão sendo “atacadas” pelo álcool e as drogas; jovens e até crianças fazendo uso de álcool e partindo para outras drogas. Muitas vezes, esse ataque acontece não apenas de fora para dentro, mas de dentro para dentro.
A dependência química é uma doença multifatorial (diversos fatores podem levar alguém à dependência). Não é algo planejado, ninguém quer se tornar um dependente, mas isso acontece. E acontece com famílias cristãs, pessoas “normais”, como nós.
Dentro destes múltiplos fatores que causam a dependência, destaco exatamente o ambiente familiar. A “falta” de tempo para a família, para o diálogo, para os jovens e crianças, aumenta o risco de que algumas coisas fujam do normal. E uma delas é o uso e abuso de drogas lícitas e ilícitas.
Deus, pela sua Palavra, nos orienta que a família deve ser preservada. No linguajar “ielbiano” (entre membros da Igreja Evangélica Luterana do Brasil – IELB) costumamos até dizer que cada casa deveria ser um altar de Deus. Pois bem, como está esse nosso altar? Nossos lares são abastecidos com a Palavra diariamente? Estamos utilizando o tempo que Deus nos deu de maneira sábia? Estamos indo também à Casa de Deus para louvar e agradecer, pedir e suplicar? (Ec 3).
Nossa família é uma benção de Deus. Foi ele mesmo quem a instituiu, para que nela possamos exercitar o amor. Diálogo sincero e tempo de qualidade são armas contra possíveis problemas com a dependência.
E se já tenho um caso de dependência em minha casa? Procure ajuda. Deus proporciona ajuda através de grupos de apoio, casas de recuperação e também através da igreja. Nossa família da fé estará pronta a ajudar.
O problema das drogas e do álcool está à nossa porta: ou logo ao lado de fora, ou já dentro dela. Que, como pais, possamos ajudar com nossos exemplos, lembrando o conselho de Salomão em Provérbios 13.24, de educar os filhos, pois se não, quem os educará?
A solução começa em casa, conversando, dedicando tempo e ouvindo a voz de Deus pela sua Palavra. Afinal, mesmo nestes dias modernos e cada vez mais corridos, a Palavra de Deus continua “viva e eficaz” (Hb 4.12) e “útil para o ensino, para a repreensão, para a correção, para a educação na justiça” (2Tm 3.16).