O medo é um sentimento necessário e importante na vida humana. Também pode ser algo terrível, que leva ao desespero, à solidão ou à depressão. Há muitos medos sendo manifestos, especialmente em tempos pandêmicos. Dentre as fobias sociais e pessoais, penso que o medo da morte foi acentuado nesses dois últimos anos.
Você já caminhou pela rua, meio apressado, sabendo que estava sendo vigiado? Numa estrada escura, de noite, ou quando as luzes começam a mudar. Com aquela sensação estranha própria a quem fica ansioso quando está começando a escurecer. Medo do escuro, medo constante de que algo esteja sempre perto, aquela fobia de que alguém esteja ali? Ou em casa, já correu seus dedos pela parede, sentindo a pele de sua nuca arrepiar, quando estava procurando pela luz?
O professor Belchior compôs uma poesia sobre o medo: Pequeno mapa do tempo. Destaco uma estrofe em que ele diz “eu tenho medo e medo está por fora. O medo anda por dentro do teu coração. Eu tenho medo de abrir a porta que dá para o sertão da minha solidão”. Em uma pequena poesia, ele utiliza por cinquenta e quatro vezes a palavra medo, para expressar algo muito íntimo à natureza humana. Quem já sofreu ansiedade ou depressão compreende muito bem como é fácil abrir a porta que dá para o sertão da solidão e o quão difícil é sair de lá.
Neste mês celebramos a Reforma. Lembrei de dois episódios em que o reformador Lutero demonstrou seus medos, da morte e da ira de Deus.
Um acontecimento mudou a vida de Lutero: em 2 de julho de 1505, durante uma grande tempestade, ele foi atingido por um raio. Diante da perspectiva da morte, ele temia ter que, despreparado, ficar diante de Deus. Então, ele clamou a Santa Ana, e prometeu se tornar um monge caso sobrevivesse. Dias depois, Lutero bateu à porta do Mosteiro dos Agostinianos Eremitas, em Erfurt, e pediu para ser aceito na ordem.
O medo da morte e da ira de Deus levou Lutero ao mosteiro. Assim, Deus restaurou o evangelho à sua igreja com a Reforma Luterana.
O apóstolo João ensina como lançar fora ou vencer o medo: “e nós conhecemos o amor e cremos neste amor que Deus tem por nós. Deus é amor, e aquele que permanece no amor permanece em Deus, e Deus permanece nele. Nisto o amor é aperfeiçoado em nós, para que, no Dia do Juízo, mantenhamos confiança; pois, assim como ele é, também nós somos neste mundo. No amor não existe medo; pelo contrário, o perfeito amor lança fora o medo” (1Jo 4.17-19).
A paixão e morte de Jesus e sua gloriosa ressurreição são a expressão máxima do amor de Deus por nós, apesar de nós e nossos medos. Jesus cumpriu a Lei, venceu o diabo, o pecado, a natureza humana e a morte. Assim, lançou fora todo medo, angústia e dor. Ele nos deu o Espírito Santo de Deus e, “Porque o Espírito que vocês receberam de Deus não torna vocês escravos e não faz com que tenham medo” (Rm 8.15).
Jesus transformou o medo de Lutero em amor. Por amor ao evangelho salvador, Lutero foi instrumento nas mãos de Deus para lançar fora o medo que atemorizava muitas pessoas, que só conheciam o Deus da ira e da morte. Hoje celebramos a Reforma na certeza de que Deus é amor e, em Cristo, somos amados por ele.
Lembro de um desafio enorme que tive no ministério pastoral. Estava com medo, indeciso, inseguro. Busquei aconselhamento com um pastor amigo. Ele me disse: Joel, você está com medo? Vai com medo mesmo. Jesus lançou fora o medo, ele está contigo!
Joel Müller
Vice-presidente de Ensino