Os jovens e a igreja

Comemora-se no dia 12 de agosto o Dia Internacional da Juventude, criado por iniciativa da Organização das Nações Unidas (ONU) em 1999. No Brasil, essa data entrou no calendário de eventos a partir de 2002, e, no dia 13 de abril, se festeja o Dia Nacional da Juventude. Isso evidencia a importância que se atribui ao jovem na sociedade e a necessidade de investir na sua educação, considerando que ele representa o seu futuro.

Os jovens também constituem uma parcela significativa da igreja, e, como tal, demandam cuidados especiais. O estímulo para a produção desta matéria veio da preocupação da igreja com o vertiginoso aumento do afastamento de jovens da prática religiosa. Analisamos, a seguir, o perfil do jovem na atualidade e sua forma de encarar e praticar a religião. Por fim, assumimos o desafio de apresentar alternativas de ação na igreja com o objetivo de reduzir ou evitar a evasão desse segmento das congregações.

Perfil do jovem atual

A Proposta de Emenda Constitucional (PEC da Juventude) de 2008 estabeleceu a fase de 15 a 29 anos como a faixa etária na qual o jovem enfrenta a crise da adolescência e busca alcançar a maturidade adulta. Nesse período ele se prepara para o exercício de uma profissão e procura um espaço na sociedade.

A transição da infância para a adolescência é marcada pela puberdade, que constitui uma fase de grandes e rápidas mudanças físicas (alterações hormonais; crescimento em altura e peso; aparecimento dos pelos pubianos; início do ciclo menstrual e aumento dos seios e do quadril nas meninas; crescimento da barba, aparecimento da voz grave e aumento do tórax e testículos nos rapazes).

No plano afetivo observam-se frequentes alterações no estado de ânimo ou humor (mudanças rápidas no astral do adolescente desvinculadas de fatos desencadeadores objetivos). Em termos cognitivos, acontece o desenvolvimento do pensamento no seu nível máximo, isto é, o jovem alcança, segundo Piaget, o pensamento operatório formal. No tocante às relações sociais, ganham especial importância as amizades, pois estas se tornam mais íntimas, sinceras e abertas.

Os jovens nascidos a partir do novo milênio são identificados como geração Z. Eles têm grande preocupação com a aparência, são comunicativos, hiperconectados, críticos, realistas, práticos, lógicos e autodidatas. Consomem muito tempo na internet, adoram ir a festas, são fortemente motivados por novas tecnologias e maníacos no uso do smartphone (eles o usam à mesa, no banheiro, no trabalho, na escola).

Já os jovens da geração anterior (geração Y), e que estão incluídos na faixa etária referida acima, nasceram num momento político de retomada da democracia, conviveram com as novas tecnologias (computador, jogos eletrônicos, internet, smartphone, TV a cabo, etc.), viveram em famílias reduzidas e tiveram uma educação mais liberal. Eles costumam ser sinceros, questionadores, criativos, originais, ousados e inseridos nas novas tecnologias.

Visão da religião pelo jovem

Segundo dados do IBGE, no final de 2020, o Brasil tinha em torno de cinquenta milhões de jovens na faixa etária de 15 a 29 anos. Esses jovens representam 26,8% da população brasileira.

Se os cristãos presentes num culto tivessem a mesma representação das diferentes faixas etárias da população brasileira (ou de alguma região) teríamos, em média, o percentual de 26,8% deles nos cultos. É esta a realidade observada entre as pessoas que assistem regularmente aos cultos? Seria interessante levantarmos dados referentes às faixas etárias das pessoas que frequentam os cultos nas nossas comunidades. Com base na observação visual nos locais de culto que frequentamos, arriscaria afirmar que predominam as faixas etárias de adultos médios e de terceira idade.

As pesquisas recentes evidenciam o crescimento do número de jovens que informam não ter nenhuma religião, bem como daqueles que se declaram religiosos, porém não frequentam a igreja. Um dado do IBGE nos dá uma noção dessa tendência: em seis anos o percentual de evangélicos que abandonaram sua fé saltou de 0,7% para 2,9%.

A revista on-line do Instituto Humanitas da UNISINOS publicou, na sua edição de 8 de julho de 2013, o artigo Jovens, o futuro da Igreja em fuga. A matéria informa que não alcança 15% o número de jovens entre 18 e 30 anos que frequentam a igreja ou que relatam orar com frequência; os que confessam acreditar na existência de Deus constituem 30%; e os que creem em salvação eterna e em vida após a morte representam apenas 13%. Esses números são desanimadores, mas nos obrigam a refletir sobre os fatores que estão reduzindo a atração da mensagem da igreja na atualidade. Ou, por outro lado, quais as causas da crescente incredulidade de nossos jovens? Está a igreja fazendo o investimento necessário na proclamação da Palavra aos jovens?

Participação dos jovens nas atividades religiosas

O jovem representa o ontem, o hoje e o amanhã da igreja, visto que desde o batismo (quando foi admitido na igreja) a pessoa já passa a ser membro de uma congregação, o que fica consolidado com a confirmação (tendo acesso à santa ceia), e, ao completar a maioridade legal, adquire o direito de participar ativamente nas decisões de diretoria, das assembleias e das convenções. Portanto, é incompleta e inadequada a afirmação de que o jovem representa só o futuro da igreja.

O Mensageiro do mês de junho deste ano nos trouxe algumas informações sobre a participação dos jovens nas atividades online das congregações da nossa IELB durante a pandemia, com base nas respostas dadas a um questionário lançado pela psicóloga Miriam Raquel Strelhow. Os dados coletados talvez não sejam representativos da totalidade dos jovens, visto que o instrumento de pesquisa atingiu quase somente pessoas luteranas ativas nas congregações. Portanto, ficaram de fora os membros luteranos afastados das atividades online.

Em relação à prática da oração, os dados indicam redução dessa prática para aqueles que afirmaram fazê-la uma vez por dia ou algumas vezes por semana, e, por outro lado, um aumento dela entre aqueles que oram mais de uma vez por dia. Em relação às atividades da igreja houve uma redução de participação em torno de 50%, seja nos cultos ou seja no grupo de jovens.

Nessa pesquisa, dentre várias sugestões apresentadas por eles como alternativas para ajudar a manter a fé durante a pandemia, destacam-se:

  • realizar encontros interativos através de dinâmicas de grupo e/ou jogos online;
  • promover estudos envolvendo temas atuais ou polêmicos, com reflexões e orientações bíblicas;
  • encaminhar, também aos jovens, de forma personalizada (WhatsApp, YouTube, Facebook, …), convites para participação nas atividades da igreja;
  • identificar os dons de cada jovem para incentivá-lo a colocá-los a serviço da congregação e, dessa forma, acolhê-lo de acordo com suas aptidões;
  • ouvir o jovem: suas ideias/opiniões, bem como suas dúvidas/problemas com vistas ao seu aconselhamento pastoral.

Propostas de ações visando reduzir a evasão de jovens

Como hipóteses de causas da evasão dos jovens podemos citar a possível aversão aos cultos tradicionais, as características do pastor que atua na comunidade, a influência da cultura ateia que prevalece em diferentes contextos, e, entre eles, o universitário, etc.

É fundamental estancar o ritmo acelerado dessa evasão em massa. Igualmente precisamos repensar a proclamação da mensagem de Cristo de forma que esse segmento da igreja seja alcançado pela Palavra. As sugestões acima elencadas pelos próprios jovens constituem um ponto de partida.

As alternativas, listadas por eles, podem ser complementadas com uma boa pesquisa junto aos membros e, especialmente, atingindo os evadidos para encontrar as verdadeiras razões para os afastamentos.

Mesmo que um projeto de ação tenha como foco o jovem, recomenda-se que essas ações tenham início antes da confirmação.

Cabe ressaltar que uma pessoa que faz parte de um grupo só se afasta dele se não se sentir efetivamente acolhido pelo grupo (marginalizado). Nesse sentido, propõe-se implementar um programa de integração de jovens recém-confirmados e outros vindos por transferência ou profissão de fé, isto é, possibilitar a formação de vínculos com membros mais antigos na comunidade para facilitar a identificação com o novo grupo. Dessa forma, reduzimos a tendência ao afastamento das atividades da comunidade por falta de vínculos.

O processo de instrução de confirmandos envolve dois elementos equitativamente importantes: a questão formativa e a integração entre os membros da turma. Para o segundo aspecto recomendamos a aplicação de técnicas de dinâmica de grupo.

No ano que antecede ao ingresso na instrução de confirmandos, isto é, no último ano de frequência na Escola Dominical, esta passagem precisa ser trabalhada pelo pastor ou outro responsável na perspectiva de promoção. Isto é, que o jovem perceba essa mudança em termos de ganho de status.

Uma outra ação com o objetivo de reduzir ou evitar a evasão seria convidar jovens confirmados recentemente (desde que avaliado que poderiam dar um depoimento positivo) para conversar sobre a experiência de confirmado e, como tal, participar da santa ceia, do grupo de jovens e das demais atividades da congregação. Eles também podem detalhar aos confirmandos o que se faz nas reuniões dos jovens. Mais adiante, eles podem retornar com vistas a formalizar o convite para participar das atividades da Juventude.

Uma experiência que pode constituir uma “vacina” contra o abandono da igreja é realizar atividades com o objetivo de favorecer vínculos de amizade, de coesão e de integração no grupo. Para isso, cabe ao pastor ou outro responsável pela instrução estimular, quase subliminarmente, atividades de interesse comum entre os jovens confirmandos fora do horário das aulas. Se a proposta inicial não surtir efeito, sugere-se fazer contato com os pais dos confirmandos, recomendando que esses encontros aconteçam.

Se a turma de confirmandos tiver um número suficiente que permita formar pelo menos dois grupos de três ou quatro integrantes, recomenda-se a realização de gincana esportiva ou cultural, do tipo competição-cooperação, com a finalidade de fortalecer o vínculo grupal. Nestes casos, a formação de grupos deve obedecer aos critérios de autoescolha (o pastor só indica quem fará a escolha dos componentes de seu grupo), homogeneidade (não pode haver um grupo mais forte e outro mais fraco) e rotatividade entre os componentes quando se repete essa atividade (de uma gincana para outra deve mudar a composição do grupo, ou seja, na nova escolha, não pode escolher alguém que já foi do grupo na última gincana).

A manutenção e o fortalecimento da fé resultam do contato frequente com a Palavra através da ação do Espírito Santo. Desenvolver hábitos de envolvimento com leitura bíblica, oração, devoções diárias e participação dos cultos deve ser objetivo de qualquer projeto que visa reduzir a evasão. Trabalhar tais questões durante a instrução de confirmandos pode ser bem produtivo se não tiver caráter de cobrança. Sugere-se, por exemplo, debater assuntos de como e quando orar, ler a Bíblia, opções para as devoções diárias, conversar sobre o culto.

Um projeto que tenha como objetivo reduzir a evasão de jovens precisa abranger não só os membros natos, mas também aqueles que se tornaram membros da congregação por transferência ou profissão de fé.

Toda comunidade precisa desenvolver um processo de comunicação com seus membros que não seja excludente, isto é, que as mensagens alcancem, pelo menos, a maioria das pessoas da congregação, sejam elas jovens, adultas ou idosas (contatos por WhatsApp, YouTube, Facebook, telefone, mensagens por celular, etc). Além da comunicação interna, precisa também ter alcance externo, de modo a levar a mensagem a quem ainda não teve oportunidade ouvir a Palavra.

Sugere-se, ainda, planejamento e execução de um projeto de acompanhamento da regularidade da participação dos membros – jovens e não jovens – (especialmente os transferidos e os que fizeram profissão de fé) nas atividades da Comunidade, não com caráter de policiamento, mas para organizar uma planilha de contatos e visitas com o objetivo de resgatar seu envolvimento nessas atividades. Talvez a constituição de um pequeno grupo de trabalho que tenha tal encargo traga resultados extraordinários para a manutenção dos membros na congregação.

Uma questão que tem sido muito debatida na igreja diz respeito aos dons que Deus concede a cada pessoa alcançada pela fé. Durante toda a caminhada do indivíduo na igreja, desde a infância até a vida adulta, é de fundamental importância a identificação dos seus dons, e, dentro das possibilidades, efetivar um convite personalizado para colocá-los a serviço da comunidade. Isso fará com que ele se sinta valorizado e acolhido de acordo com suas aptidões.

O Espírito Santo age por meio da mensagem da Palavra. Portanto, o pré-requisito para alcançar a mensagem é pelo ouvir. Creio que todos nós inferimos que os jovens têm sua forma peculiar de comunicação. Os dados da pesquisa com eles, referido no item acima, nos oferecem algumas informações sobre suas preferências. Logo, anunciar o evangelho em formato que alcance melhor os jovens constitui um desafio para a igreja. O apóstolo Paulo descreve a sua estratégia visando alcançar a todos e, assim, por todos os modos, salvar alguns (1Co 9.19-22).

Provavelmente muitos jovens frequentem uma universidade. Acredita-se que esse ambiente estimule o ateísmo e o afastamento de práticas religiosas. Certamente os estudantes universitários merecem uma atenção especial com o objetivo de fortalecer sua fé de modo a dar-lhes condições para enfrentar as forças que buscam afastá-los da igreja. A IELB tem uma organização auxiliar (Associação Nacional de Universitários Luteranos – ANUL) que congrega as pessoas envolvidas no ensino superior, mas que também sentiu os efeitos da evasão. O último Congresso da ANUL, realizado em 20 de março de 2021, decidiu delegar ao Departamento de Educação Cristã – DEC a coordenação da ANUL e a nomeação de uma diretoria. Fica a expectativa de que o DEC, junto com a futura Diretoria da ANUL, das diretorias das congregações e o apoio e acompanhamento dos pastores, possibilitem a permanência ou o retorno desses jovens ao aprisco do bom pastor.

Uma outra organização auxiliar da IELB, que vem prestando relevantes serviços no segmento de jovens, é a Juventude Evangélica Luterana do Brasil – JELB, atualmente presidida por Julio Cezar Rutke. A JELB certamente precisa do apoio de toda Igreja para efetivar seu papel de incentivar o estudo da Palavra e o viver cristão dos jovens e, assim, ajudar a evitar sua evasão.

A Bíblia e a Psicologia da Educação vêm valorizando a influência das mães na educação dos filhos. O apóstolo Paulo reconheceu isso quando escreveu a Timóteo: Lembro da sua fé sem fingimento, a mesma que, primeiramente, habitou em sua avó Loide e em sua mãe Eunice, e estou certo de que habita também em você (2Tm 1.5). Certamente o testemunho e a prática da fé pelas mães representam um papel destacado no fortalecimento da fé nos jovens. Logo, um trabalho de conscientização desse papel sendo realizado com as mães em todas as congregações representará uma força de atração aos jovens nas atividades da igreja.

Bruno Edgar Ries

Pedagogo com habilitação em Psicologia da Educação

[email protected]

Referências

BÍBLIA. Português. Bíblia Sagrada: antigo e novo testamento. Tradução de João Ferreira de Almeida. Nova Almeida Atualizada. 3.ed. Barueri: Sociedade Bíblica do Brasil, 2017.

Site: <https://www.ibge.gov.br/estatisticas/sociais/populacao/9109-projecao-da-populacao.html?=&t=resultados>

Site: <http://www.ihu.unisinos.br/noticias/521731-jovens-o-futuro-da-igreja-em-fuga-parte-1>

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