A televisão trouxe, faz algum tempo, uma carta escrita por um homem em que este se referia à sua esposa e filha. Dizia que as amava ternamente, mas que, para ele, a situação chegara a um ponto extremo, e concluiu: “Não tem mais volta”. Ato seguinte, foi até sua esposa e filha e descarregou uma arma nelas. Mas deixou o último cartucho carregado para sua própria cabeça. Realmente, para ele não teve mais volta, pois morreu. Felizmente a esposa e a filha sobreviveram. O que expressou esse homem com a frase: “Não tem mais volta”? Isto, que ele, por não se ter cumprido o que ele queria, se dobrou sob seu orgulho ferido e sucumbiu sob sua mágoa. Também, que ele expressou sua falta de confiança no bem e no diálogo. Também, que ele mostrou sua revolta e seu desespero ou sua completa falta de força para reagir contra o mal.
Por que escrevo isso a mim e a você que somos cristãos – e cristãos com muita experiência na vida e na fé? Porque, como Lutero afirma, “pessoas que se julgam seguras são exatamente as que o diabo fascina e depois precipita no desespero” (LW-SL; 9.263,36). Julgar que “não tem mais volta” é submeter-se ao maligno, cujo propósito é destruir a obra de Deus, ou seja, impedir que venha o reino de Deus.
Os cristãos que viveram na segunda metade do primeiro século cristão, também tiveram e sentiram experiências muito amargas. Não somente viram muitos líderes cristãos serem presos pela justiça gentia que ditava as leis, e serem violentamente mortos, mas também que suas famílias foram destroçadas pelas mesmas crueldades. Se fosse pelos próprios cristãos, também teriam cometido atos violentos, e desesperado por completo. Mas Deus lhes disse: “Pensem no sofrimento dele (de Cristo) e como suportou com paciência o ódio dos pecadores. Assim, vocês, não desanimem, nem desistam”. Com essa afirmação, Deus lhes garantiu: Sim, a situação tem volta; por isso confiem e prossigam!
O próprio Deus, quando o diabo irrompeu no paraíso e prostrou Adão e Eva no pecado, não disse: “Não tem mais volta”, mas foi atrás dos perdidos, clamando: “Adão, onde estás?”, e lhes proveu redenção no “descendente” da mulher. Cristo Jesus é este “descendente”. Ele trouxe “plena e poderosa salvação” para todos os pecadores. Ele não quer que um só pecador desespere, mas que todos se arrependam e vivam. Cristo sofreu e suportou em seu corpo o ódio dos pecadores, mas ele venceu e vive e reina em glória. Nele já está derrotado o plano de Satanás, que só busca o desespero do pecador e sua eterna condenação. Agora todo aquele que crê em Cristo tem a vida eterna. Graças a Cristo, nosso desespero acabou! Nele temos viva esperança!
Queridos(as) irmãos(ãs) na fé em Cristo. Cada um de nós também já viveu – ainda vive – e vai precisar viver – situações muito angustiantes. Situações que dilaceram a alma e atacam os melhores sentimentos. Mas isso não nos diz que “não há mais volta”. Cristo mostrou que há volta. Ele nos incluiu nesta volta. Nele, estamos reconciliados com o Pai e somos seus filhos amados e benditos. Pensemos em Cristo, em especial quando a situação estiver escura. Temos a certeza de que com ele somos mais do que vencedores. Por isso, mesmo chorando de dor, cantemos com Lutero: “O Verbo eterno ficará,/sabemos com certeza,/e nada nos perturbará/com Cristo por defesa./Se vierem roubar/os bens, vida e o lar/– que tudo se vá!/Proveito não lhes dá./O céu é nossa herança” (HL 165, 4). Amém.
Eugenio Dauernheimer
Pastor emérito
Canoas, RS