Música, Reforma e Pandemia (parte 3)

Entre os feitos da Reforma liderada por Martinho Lutero, no século 16, está a aproximação das pessoas da Teologia, também através da música. Confira a entrevista realizada com o pastor Ezequiel Blum, de Balneário Camboriú, SC.

* Acompanhe também a matéria completa do Mensageiro Luterano, acessando aqui.

Lutero, entre tantas outras coisas, colocou letra cristã em músicas populares. Você acha que essa também foi uma forma de evangelizar? E hoje, de que forma podemos levar Cristo para Todos através da música?

Lutero foi muito eficiente em sua pregação, também através da música, e muito atual para o seu tempo. Certamente a música foi um instrumento muito eficaz de evangelização na época, assim como ainda pode ser.

Não significa que devamos simplesmente copiar as estratégias de Lutero para os dias de hoje. São outros tempos, mas podemos tirar lições. Penso que, especialmente com a facilidade de divulgação pelas redes sociais hoje em dia, quanto mais investirmos tempo e nas mais diversas formas e estilos musicais, mais chance teremos de atingir as pessoas. Há espaço para muitas formas, pois as pessoas são diferentes e têm gostos musicais diferentes.

E precisamos sempre lembrar que, dentro da igreja, não somos concorrentes para levar o evangelho através da música, não podemos simplesmente ter o objetivo de conseguir mais curtidas e compartilhamentos do que um outro que também leva a mesma mensagem do evangelho. Somos parceiros, cada um atingindo um grupo diferente de pessoas, e, juntos, podemos atingir um número incrível. O que mais importa é um apoiar o outro, ajudar a divulgar e não ter medo de se arriscar, colocando seu dom à disposição e buscando aprender cada vez mais para levar da melhor maneira possível a mensagem de Deus.

Nesse período de pandemia, isolamento e igrejas fechadas, pode-se dizer que a parte musical também precisou ser reestruturada para continuar. Muitas adaptações para os músicos, que não podiam mais fazer seus shows, mas também para as congregações, que tinham seus momentos de louvor em comunhão entre os irmãos. Para você, quais as principais adaptações que precisaram ser feitas com a pandemia?

Durante a igreja fechada, aprender sobre transmissão foi fundamental. Aprender a fazer uma simples gravação também já poderia ser um grande desafio. No retorno das atividades, ainda em meio à pandemia, também tivemos diversos desafios com os músicos. Um deles, obviamente, era a questão de seguir as normas, com obrigatoriedade de uso máscara até mesmo para cantar, bem como a organização do espaço por causa do distanciamento social.

Mas um outro grande desafio foi o fato de agora termos os cultos transmitidos. A partir disso, não era mais só equalizar o som que se ouvia na igreja, também tinha a transmissão. E, acreditem, é “outro mundo” trabalhar assim. Entre erros e acertos, fomos aprendendo, e ainda temos muito a aprender. Vale destacar ainda que, com a intensificação das produções musicais, também passamos a ter mais recursos musicais disponíveis na internet (músicas de conteúdo adequado e gravadas por membros da nossa igreja), facilitando o uso dentro dos cultos e transmissões.

Hoje, facilmente um irmão na fé pode participar do culto da minha congregação através de um vídeo, mesmo que more centenas de quilômetros de distância. Não que isso não fosse possível antes, mas a quantidade e a qualidade de materiais foram se intensificando. E penso que isso foi uma grande conquista, além, é claro, das lives musicais a que tivemos a oportunidade de assistir e participar cada vez mais.

Você vê as mudanças que ocorreram com a pandemia como se fossem novamente uma “reforma” no jeito de ser igreja?

Em certo aspecto, podemos dizer que passamos por uma “reforma” constantemente, mas no que diz respeito à forma, não ao conteúdo. Na época de Lutero, a Reforma tinha seu foco no conteúdo do evangelho, que estava desviado. E ele também aproveitou muito bem o que tinha à disposição na sua época. Precisamos nos adaptar ao tempo em que vivemos, porém não podemos mudar o conteúdo que temos. Em se tratando da “reforma” no jeito de ser igreja, a pandemia veio para ser um marco na história. Não só na igreja, mas também nela. Não foi com um estudo pensado, planejado, verificando adaptações necessárias para o momento. Foi uma obrigação que nos levou a estudar e buscar a melhor adaptação, a melhor “reforma”.

É difícil mensurar se isso nos levou a aproximar as pessoas de Jesus ou não, pois muitos membros se afastaram da igreja, ao mesmo tempo em que mais pessoas passaram a ouvir a pregação do evangelho pelas redes sociais. Certamente, as novas formas com que aprendemos a lidar vão muito mais longe do que um templo fixo, com programações apenas presenciais. Entendo que estas novas adaptações ao menos facilitaram ao evangelho a chegar mais longe, podendo entrar até mesmo numa casa onde ninguém mais poderia entrar, a não ser o próprio morador. Assim, em questão do número de oportunidades e dos meios utilizados, podemos dizer que hoje conseguimos levar Jesus a mais pessoas.

Lutero também usou a música popular para aproximar as pessoas da teologia. Em nossos tempos, seria também uma forma de pensar na oportunidade e falar de Jesus?

Entendo que a variedade atinge o maior número de pessoas. Acredito que a resposta para estas questões nunca será abandonar o que é tradicional em busca do mais contemporâneo, mas tentar entender que as duas questões são válidas e precisam ter o seu momento. Precisamos valorizar a história dos nossos hinos e compositores, porém nunca parar de compor novas músicas e buscar novos estilos.

Vivemos tempos em que muitos estilos musicais chamam a atenção, até mesmo os considerados “antigos”. Mas também aquilo que é atual, obviamente. Um determinado grupo de pessoas pode preferir um estilo, enquanto outro grupo pode não gostar tanto. Talvez tenhamos mais perguntas do que respostas para isso. E levantar perguntas nos leva a uma reflexão madura e decisões mais acertadas. Mas, de qualquer maneira, independentemente da forma que vamos usar, precisamos cuidar com o conteúdo que será apresentado.

De que forma o período que estamos vivendo influenciou ou interferiu na composição de músicas/arranjos ou escolha de repertório?

Confesso que a ausência de pessoas na igreja, inicialmente, me trouxe muita dificuldade e aflição. Eu tinha vontade de chorar quando falava para uma câmera com a igreja quase vazia (apenas minha família presente). Por outro lado, eu via as pessoas “entrando” na igreja pelas redes sociais e aprendi a entender que essa era a forma possível naquele momento. Minha família não estava sozinha, pessoas estavam participando conosco e, principalmente, Deus sempre esteve ali. E assim, a Palavra de Deus, também através da música, estava chegando a pessoas muitas vezes fragilizadas pelo que estavam vivendo. Era, sim, uma grande oportunidade para levar o evangelho, mostrando às pessoas que Deus estava com elas mesmo em meios às aflições.

Na época em que iniciou a pandemia, já fazia muito tempo que eu não compunha mais música. Gravar um vídeo de música, então, uma “eternidade”. Para mim, aquele momento de vida trouxe uma motivação especial nesse sentido novamente, me motivando a gravar, compor e fazer arranjos.

Daqui para a frente, você acha que essa nova forma de fazer música, cultos, estudos bíblicos, pode alterar a forma como louvamos a Deus?

Penso que muita coisa continuará diferente, daqui para frente. Sobre afetar ou ser prejudicial, entendo que vai depender do conteúdo que levarmos, pois se faz necessário esse repensar formas a partir de agora, como sempre foi no passar dos anos. A diferença é que agora tivemos uma “quebra” nas formas a que estávamos acostumados.

Acredito que, como igreja, acordamos e amadurecemos em algumas questões. O período de reflexão que a pandemia nos trouxe, nos fez valorizar o que é fundamental. E, inicialmente, de modo forçado, tivemos que nos reinventar para que o evangelho continuasse. Assim, aprendemos a trabalhar com diversos veículos de comunicação. Muitos até já estavam aí, mas não os usávamos de forma eficaz ou nem mesmo imaginávamos que existiam, além dos novos meios que vão surgindo. Infelizmente, nesse meio tempo, percebemos o afastamento de muitas pessoas da igreja. Sabemos que a pandemia ainda está aí, e muitos ainda têm receio de vir presencialmente. E não cabe aqui o julgamento quanto a isso. Mas o tempo que ficamos fechados fez com que muitos perdessem o hábito de ir ao culto. E vários desses não criaram o hábito nem mesmo de participar online. Assim, quando voltaram os cultos presenciais, muitos membros que eram ativos não voltaram.

Por outro lado, novas pessoas apareceram, algumas conhecendo a igreja primeiramente pela internet. Hoje, temos muitas outras pessoas “dentro” da nossa igreja também através dos cultos online, pessoas que talvez nunca nem passariam na frente do nosso templo. E isso é maravilhoso. Sobre se as pessoas vão retornar presencialmente, penso que todos aqueles que, tocados pela Palavra de Deus, entenderem a necessidade do culto público, sim, estarão de volta.

A oportunidade de estar com os irmãos na fé e de participar da santa ceia não é substituível, a transmissão online nunca trará a amplitude que o presencial nos oportuniza. Se fosse assim, por exemplo, apenas assistiríamos vídeos pela internet hoje em dia, nunca teríamos vontade de ir a um lugar de forma presencial, porque já vimos em vídeo. Mas sabemos que não funciona assim. Queremos viajar para um lugar que vimos na internet, queremos assistir a um show ao vivo mesmo que já o conheçamos em vídeo, queremos ver presencialmente uma palestra de alguém famoso mesmo que já tenhamos lido todos seus livros. O presencial sempre terá seu lugar. Assim, o que a santa ceia nos oferece, não é possível passar por vídeo, além, é claro, da diferença que há na vivência de comunhão que temos apenas na forma presencial.

Qual era/é o seu principal objetivo com os vídeos de música, inclusive aqueles com as várias vozes/dons musicais do Ezequiel? Vê que eles foram alcançados?

Quando começamos a fazer vídeos de música, surgiu a ideia de trazer algo mais leve em meio a tantas notícias tristes que estavam ao nosso redor, por conta da pandemia. Depois, então, surgiu o tema “Você não está sozinho”, um projeto que tinha o objetivo de lembrar que Cristo sempre está com cada um de nós. Assim, a brincadeira com os “clones” (vários “Ezequiéis”, no vídeo, como alguns começaram a dizer) acabou levando a notícia de que, além de você mesmo (que é muito importante para Deus), Jesus sempre está com você. Por um lado, uma brincadeira para trazer leveza, por outro, um conteúdo sério e importante que conforta nosso coração. Estes vídeos podem ser assistidos pelo canal Ezequiel Blum, clique aqui. .

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