A contradição da cruz

Como um objeto de tortura tornou-se sinônimo de esperança?

* Daniela Fischer Buss Weiss

Algumas vezes, um pouco antes do início do culto, me pego observando a cruz fixada no altar da igreja. Ela está lá; uma cruz de madeira, grande e centralizada, como um lembrete físico do sacrifício de Jesus pelos nossos pecados. Não é possível entrar e sair do templo sem olhar para ela. Acostumei-me a vê-la como um sinal de esperança. Uma contradição, se pensarmos em para qual finalidade esse objeto foi criado.

Se pudéssemos voltar ao tempo e contássemos a um cidadão da Roma antiga que a cruz é um objeto que nos traz esperança, ele diria que somos loucos. Para ele, a cruz significava desgraça, humilhação e morte.

Na antiguidade, a cruz era um artifício de tortura, reservado aos piores inimigos de Roma. A crucificação não poupava o condenado da exposição pública e da humilhação. Era usada apenas em casos de traição, levantes militares, terrorismo e crimes violentos. Uma retribuição a altura pelo crime: com muito, muito derramamento de sangue! Normalmente, os condenados precisavam carregar suas cruzes até o local da execução, para que toda a população visse e, não se atrevesse a contrariar o Império. Alguns médicos relatam que a dor desse tipo de punição deveria ser dilacerante. Cícero, orador romano, disse que: “a simples menção da cruz deveria ser removida não apenas do corpo de um cidadão romano, mas da sua mente, seus olhos, seus ouvidos”. A cruz era cruel.

Apesar de estar familiarizada com os relatos bíblicos da crucificação, o horror da prática desse tipo de pena de morte se tornou mais “palpável” para mim, ao assistir, no cinema, ao filme “A Paixão de Cristo”. Mel Gibson, diretor do filme em questão, foi, diria eu, extremamente realista na caracterização da crueldade da condenação a morte pela cruz. Lembro-me de, entre lágrimas, repetir em uma oração silenciosa: “Eu não merecia isso, Senhor”.

Mas, como um objeto de tortura tornou-se sinônimo de esperança? Pela mesma razão que eu e você, pecadores, condenados a morte eterna, traidores da pátria celeste, recebemos perdão, vida e salvação: “Porque Deus amou o mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigênito, para que todo o que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna”. (João 3.16)

Estamos no período da Quaresma, novamente. Tempo de refletirmos sobre o sacrifício de Jesus por nós. Tempo de olharmos para a cruz e, sentirmos todo o peso do nosso pecado sobre as mãos pregadas de Jesus sobre a madeira. De visualizarmos o escárnio e o abandono dos expectadores. De nos darmos conta de que Jesus foi o único ser humano abandonado por Deus. E de constarmos, em profunda gratidão, que Cristo escolheu a cruz por amor a nós.

* Cristã, esposa do pastor Martinho Lutero Weiss Santos, mãe do Davi (11 anos) e do Martin (7 anos), residente em Rolante, RS. Advogada, co-autora do livro Martin e Bu no Mundo das Emoções. Estudante do 6º Semestre de Teologia EAD – ULBRA. Coordenadora da Comissão Jurídica da IELB (2022-2026) e Presidente das Servas do Distrito Hortênsias (2024/2026). Gosta de escrever nas horas vagas: @daniela.buss (Instagram)

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