Eu sei em quem eu creio

O escritor argelino Albert Camus (1913-1960), filósofo existencialista, escreveu O Mito de Sísifo, ensaio sobre o absurdo (2002), obra que veio a ser considerada a principal produção do autor. Ao apresentar o mito, Camus trata da condição humana, de suas limitações, seus avanços e fracassos. Usa a mitologia grega e relata que Sísifo foi condenado pelos deuses a rolar uma grande pedra para o alto de uma montanha. Quando estava chegando ao alto da montanha, Sísifo, desesperadamente, via a pedra escapar de suas mãos e rolar montanha abaixo. E lá ia ele, de novo, recomeçar seu trabalho de subida da pedra, realizando incessantemente a mesma tarefa.

Camus não era cristão e, por isso mesmo, trata o sofrimento da vida humana como o absurdo, como algo que não tem sentido algum, mas que mesmo assim vale a pena viver a vida como enfrentamento ao absurdo. O autor termina a sua obra com a afirmação de que “é preciso imaginar Sísifo feliz”, por tentar vencer o absurdo.

Claro que não penso como Camus. Ao contrário, sou muito feliz com a condição humana que Deus, o Senhor, faz-me perceber: a condição de pecador constante, mas também, e principalmente, de perdoado, porque confio no sacrifício remidor de meu Salvador. Leio em Efésios 5.2 que “Cristo nos amou e deu a sua vida por nós como oferta de perfume agradável e como um sacrifício que agrada a Deus”. Não preciso ser como Sísifo, carregando meus pecados montanha acima e depois vendo tudo rolar abaixo, para o meu desespero e infelicidade. Não fui condenado por Deus, mas fui amado por ele e redimido para servir. Nessa condição, sou feliz e caminho para a felicidade completa depois. Minha vida não é absurda, muito menos sem sentido algum. Meu Deus amoroso e perdoador não apenas me ama, mas realiza e garante a minha salvação na obra redentora de seu Filho, que é oferta de perfume agradável e sacrifício que agrada a Deus.

Com base na obra de Camus, ficou conhecida a expressão “trabalho de Sísifo” para a tarefa que envolve esforço inútil e sem nenhum sentido. Atuar na Igreja de Deus não é sem sentido, e viver na comunhão com ele também não. É preciso ver nessa sociedade o corre-corre para a produção de lucros. Essa corrida louca em busca de riqueza pode tornar-se um grande problema que embrutece as pessoas e as afasta da comunhão, apontando para sentido apenas o que dá “lucro”. Viver é preciso, e trabalhar também, mas “ganhar a corrida que nos está proposta” é muito mais importante.

Por isso, eu sei em quem tenho crido, e todos os que buscam o Evangelho e na fé em Cristo andam, não sofrerão a dor da frustração. Lá no fim da vida, não haverá desesperança e não será necessário imaginar que seremos felizes e mais do que vencedores por meio daquele que nos amou, porque o seremos de fato, pois nas promessas de Deus há um “sim”.

Ari Raimann

Pastor e professor

Jataí, GO

*Texto publicado no Mensageiro Luterano em outubro de 2014.

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