Nas duas primeiras décadas de 1900, as atividades do então Sínodo Evangélico Luterano, hoje Igreja Evangélica Luterana do Brasil, IELB, estavam restritas ao estado do Rio Grande do Sul. Somente no início da década de 1920 é que o sínodo começou a dar os primeiros passos para fora do estado gaúcho. Na verdade, foram mais do que passos, foram longas viagens a cavalo e cansativas viagens de trem. O primeiro trabalho da IELB fora do Rio Grande do Sul não foi em Santa Catarina, estado mais próximo, mas no Paraná. Sobre o centenário da IELB em Santa Catarina, falaremos em edições futuras.
Em 1910, o governo federal abriu uma colonização no sul do estado do Paraná, com o nome de Núcleo Colonial Federal “Cruz Machado”, que mais tarde virou município de Cruz Machado. Esta colonização atraiu imigrantes europeus e agricultores do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina. Várias destas famílias ficaram, por muito tempo, sem atendimento espiritual. Dentre os imigrantes europeus, mais tarde surgiriam nomes que teriam funções importantes na história da IELB, como veremos adiante.
Um dos colonos que veio do Rio Grande do Sul chamava-se Joseph Mundel, que tinha sido membro do pastor John Busch, em Rio do Peixe, hoje município de Getúlio Vargas, RS. Mundel entrou em contato como seu ex-pastor solicitando atendimento pastoral para a região.
Por essa época já havia trabalho luterano no Paraná e em Santa Catarina realizado pelo então sínodo Gotteskasten (Caixa de Deus). Porém muitos não se identificaram com este sínodo e não se uniram a ele. Mais tarde, este sínodo se uniu com outros sínodos para formar a Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil, IECLB. Apesar da presença de luteranos no Paraná, a IELB ainda não estava lá.
O pedido de Mundel foi interpretado pelo Sínodo Evangélico Luterano como grande oportunidade de expansão. Então, no início de 1920, uma comissão de três pastores se deslocou ao sul do Paraná: Jonh F. K. Busch, de Getúlio Vargas, RS, Conrad J. Wachholz, de Marcelino Ramos, RS e o presidente do Distrito, Emil Müller, de Porto Alegre. A viagem era longa. Ela foi possível graças à abertura, então recente, da estrada de ferro São Paulo-Rio Grande.
No dia 9 de fevereiro de 1920, os três pastores celebraram o primeiro culto no estado do Paraná, na casa do senhor Joseph Mundel, no local chamado Rio da Areia. Este local hoje está submerso pela barragem da Usina Hidrelétrica de Foz do Areia. Neste dia foram confirmados 15 jovens e 3 crianças foram batizadas.
Se neste dia foi realizado o primeiro culto, como já houve confirmação de 15 jovens? É que o início dos trabalhos da IELB no Paraná tem uma peculiaridade, poucas vezes vista na história da IELB: ele começou por um leigo e não por um pastor. Quando os três pastores chegaram lá para o primeiro culto, Joseph Mundel já havia preparado uma turma de confirmandos, que foram confirmados no primeiro culto.
Desta forma, o dia 9 de fevereiro marca o centenário da IELB no Paraná pela realização do primeiro culto. Porém o trabalho já havia começado no ano anterior, com aulas de ensino confirmatório.
O primeiro pastor da IELB a residir no Paraná foi Germano José Beck, que chegou ao estado em 1921. Inicialmente morava na casa de um leigo chamado Edmundo Diesel. Em questão de uma semana, Beck teve três instalações, todas realizadas pelo pastor John Busch. No dia 4 de setembro de 1921, pela manhã, foi instalado em Cruz Machado. No mesmo dia, à tarde, em Rio da Areia. No dia 8 de setembro de 1921, foi instalado em Três Barras, SC, sendo que esta instalação marca um dos inícios dos trabalhos da IELB em Santa Catarina. Mas sobre isso veremos em edições futuras. O pastor que mais tarde o sucedeu, Gerhard Wilde, foi instalado em todos os locais que atendia. Essa prática de várias instalações dentro da mesma paróquia parece estar ligada à necessidade de um compromisso do pastor com cada local que atendia.
Ainda no tempo do pastor Beck, foi encaminhado o primeiro estudante do Paraná ao Seminário Concórdia: Karl August Rupp. Ele havia nascido na Alemanha. Ao que indica ele era daquelas famílias europeias que aderiram à colonização de Cruz Machado. Mais tarde, Rupp foi professor do Seminário Concórdia.
Inicialmente o trabalho era realizado em língua alemã. O primeiro culto em língua portuguesa no Paraná foi realizado no dia 15 de maio de 1926, em Poço Preto, quando também foram realizados batismos de brasileiros ali residentes.
O início dos trabalhos da IELB no Paraná passou por momentos difíceis, principalmente pela proibição do uso da língua alemã. Também viveu conflitos internos. Mas nada impediu que a obra do Senhor prosperasse. Hoje, a IELB no Paraná é composta de 10 distritos, 82 paróquias, 216 congregações, 47 pontos de pregação/missão, 88 pastores em paróquias, 19 pastores em outras funções e 35.150 membros. A expansão da IELB para os estados do Mato Grosso do Sul, Mato Grosso e Paraguai partiu, em grande parte, do Paraná.
O início dos trabalhos da IELB no Paraná despertou nomes que fizeram história dentro da história da IELB:
– Karl August Rupp. Nasceu na Alemanha, porém na infância veio ao Brasil com a família. Quando foi ao Seminário, já era morador de Cruz Machado. Mais tarde, Rupp foi professor do Seminário Concórdia.
– Friedrich W. J. Schroeder. Veio ao Brasil na infância. Quando foi ao Seminário, saiu de Linha Independência, Cruz Machado. Formou-se pastor em 1939. Foi professor do pré-seminário e coordenador da Biblioteca do Instituto Concórdia
– Annelise Moris Schroeder, esposa do pastor Friederich W. J. Schroeder. Por muitos anos foi professora de música no Seminário e no Instituto Concórdia de São Leopoldo.
– Walter Dreyer, nasceu em Hamburg, Alemanha. Veio ao Brasil na infância. Quando foi ao Seminário, saiu de Cruz Machado.
– Walter Paul Rennecke, nasceu na Alemanha. Veio ao Brasil na infância, para Cruz Machado. Quando foi ao Seminário já morava em Porto Alegre. Formou-se pastor em 1940.
– Carlos H. Moris nasceu em Cruz Machado. Formou em Magistério no Seminário e foi professor em escolas luteranas. Foi tesoureiro da IELB e coordenador do Instituto Histórico da IELB.
– Hans Gerhard Friedrich Rottmann, nasceu em Cruz Machado. Formou-se em no Seminário Concórdia e por muitos anos foi professor de música no Seminário Concórdia.
– Marie Luize Heimann, nasceu em Cruz Machado e foi secretária da presidência na gestão de Johannes H. Gedrat e Leopoldo Heimann.
Assim, em 2020, a IELB está convidada a celebrar o centenário de um dos seus empreendimentos missionários mais promissores: 100 anos de presença no Paraná.
WILDE, Gerhard. Crônica da Comunidade Evangélica Luterana Cristo de Cruz Machado, Paraná. Documento não publicado, pertencente ao Instituto Histórico da IELB.
KREBS, Edmundo; ROTTMANN, Johannes H. História do Luteranismo no Paraná. Documento não publicado, pertencente ao Instituto Histórico da IELB.
REHFELDT, Mario L. Um grão de Mostarda: a história da Igreja Evangélica Luterana do Brasil. V.1. Tradução de Dieter Joel Jagnow. Porto Alegre: Concórdia, 2003.