A temática de nossa igreja para 2023 é estarmos enraizados e edificados em Cristo. A relação das minhas pesquisas profissionais com essa temática diz respeito às matas de araucária, erva-mate, árvores nativas, raízes, plantas, sementes e comunidades tradicionais que fazem parte da pesquisa do meu doutorado. Enraizada na educação desde 1988, desenvolvo projetos ligados ao meio geográfico/histórico no Paraná.
Natureza, sementes crioulas, representam a continuidade da vida, da existência da alimentação, de vivências, práticas de muitos povos e comunidades que hoje já não existem mais. As comunidades tradicionais nos ensinam como lutaram e vivenciaram situações de esperança, dificuldades, alegrias, fortalecimento da fé, principalmente com as mudanças ambientais.
O meio ambiente clama por socorro. Estamos perdendo parte da vegetação que ainda temos em nosso planeta. As florestas, matas, campos, vegetações, estão desaparecendo. Nós estamos matando e fazendo desaparecer o que Deus nos concedeu, a própria natureza intacta e nativa, que só existiu até a chegada das primeiras populações humanas.
As sociedades humanas transformaram o meio ambiente com o tempo. Animais, plantas e sociedades primitivas desapareceram, ao provocarem desequilíbrios ou pressões ambientais sobre a biodiversidade.
A mata atlântica, os cerrados, o litoral, guardam as marcas, os sinais e a memória desses impactos e mudanças, dentro do nível e estágio de desenvolvimento próprio de cada comunidade original que surgiu ou desapareceu no território brasileiro. Algumas comunidades apresentaram uma extraordinária capacidade de adaptar-se e enfrentar os desafios ambientais em diferentes escalas de tempo e espaço, como as comunidades indígenas, quilombolas, caiçaras e faxinalenses, que formaram novas configurações sociais e econômicas.
Podemos considerar o surgimento de aldeamentos fixos, o uso do fogo nas matas, enriquecimento de plantas de interesse alimentar, medicinal, o melhoramento de espécies para a agricultura, armazenamento de sementes, como impactos na dinâmica natural da biodiversidade e como forma de histórias, marcas, registros gravados na cultura e no relacionamento desses povos com a natureza.
Ao pesquisar sobre as sementes crioulas, passamos a conhecer a natureza e a vida dessas comunidades tradicionais, através de seus conhecimentos e técnicas produtivas. Esses agricultores têm sido guardiões de um dos recursos mais importantes para a alimentação, para a vida: a agrobiodiversidade.
A semente traz consigo o significado de vida, o valor da sobrevivência, da resistência, da continuidade, da perpetuação, uma inter-relação entre conhecimentos e práticas. As sementes crioulas fazem parte do patrimônio material e imaterial (com as práticas de manejo e cultivo) de diversos povos, que ao longo dos tempos vêm conservando, resgatando, selecionando e valorizando variedades, mantendo a agrobiodiversidade adaptada a cada região, através dos guardiões de sementes.
Esses guardiões possuem o conhecimento acumulado, o saber fazer, apreendidos e transmitidos pelas gerações. Eles acreditam no potencial das sementes crioulas, o que leva a mantê-las em reprodução, em estreita relação com a natureza. É uma his-tória de produzir e reproduzir vida na natureza e com as pessoas em comunidades tradicionais.
Na pesquisa que realizei para o doutorado, entre 2018 a 2022, foram coletadas 280 variedades de sementes crioulas. Com todos os guardiões, foi encontrado grande número de sementes de feijão, milho, abóboras, legumes, temperos, o que está relacionado à estratégia de conservação de recursos genéticos básicos para sua alimentação, cultivados em locais próximos às suas casas, hortas e jardins medicinais. Encontramos 108 variedades de feijões, 20, de milho, 14, de abóboras, 6, de pipocas, 28 árvores nativas/frutíferas, 6, de amendoim, 26 temperos, legumes e verduras, 12 plantas medicinais, entre outros.
Realizar essa pesquisa e conviver com os agricultores, me trouxe de volta às minhas raízes e histórias, assim como me trouxe mais uma chance de ver que Deus nos dá tantas bênçãos, tanto aprendizado de vida. O valor de ver uma semente se reproduzindo, a sensação de conhecer outras variedades de sementes, plantas, de colocá-las na terra, vê-las crescer e se reproduzir, é obra de DEUS em nossas mãos. Assim como nossa existência é obra de Deus. Nós nascemos, crescemos e nos re-produzimos pela vontade de Deus, nós também somos sementes, plantas no jardim da existência de Deus.
Na Bíblia, temos o salmo 126.5-6: “Que aqueles que semeiam chorando façam a colheita com alegria! Aqueles que saíram chorando, levando a semente para semear, voltarão cantando, cheios de alegria, trazendo nos braços os feixes da colheita!”. Nós somos sementes, raízes que Deus quer ver reproduzir, e através de nossas ações podemos mostrar que somos gratos pela vida e pela natureza que ele nos presenteou. Precisamos cuidar do meio ambiente em sua totalidade, tornar estes espaços enraizados, fortes, como algumas plantas, raízes e sementes, que, mesmo diante de furacões e enxurradas, permanecem firmes e se renovam a cada amanhecer.
Estar enraizados em Cristo é construir nossas vidas na fé, com raízes profundas, que não se desprendem com facilidade, mas que nos enriquecem com bens espirituais e nos fortalecem. Podem cair as chuvas, transbordarem os rios, se agitarem os mares e os ventos, que as raízes e as sementes profundas permanecem, assim como a Palavra de Deus e seu Filho Jesus Cristo, que nos transformam em cristãos que crescem no amor a Deus, a seus semelhantes e à NATUREZA que ele nos deixou.
Cleusi T. Bobato Stadler
Congregação Ressurreição – Imbituva, PR