Sobre papas e pastores mirins

Ismar Lambrecht Pinz
Pastor
Congregação Cristo
Porto Alegre, RS

Qual a perspectiva luterana sobre o papado? Qual a opinião luterana sobre o discurso pentecostal dos que pregam em nome próprio, dizendo-se guiados pelo Espírito?

O papado é o principal assunto dos grandes jornais do mundo neste maio de 2025. A morte de Francisco e a escolha de Leão XIV como novo papa da igreja romana destaca-se na mídia; enquanto nas redes sociais brasileiras, fala-se muito de um “pastor mirim” chamado Miguel, de apenas 15 anos. Miguel repetia em suas pregações uma expressão que viralizou: “Of the King, the power, the best”.

Menciono essas duas situações e manifestações religiosas porque a confissão de fé luterana se distingue de ambos, entendendo que a fé escriturística (baseada na Bíblia) não está nem lá nem ali!

Como herdeiros da Reforma Protestante, mantemos três princípios que nos auxiliam a preservar o ensino de Jesus. As três premissas possuem expressões em latim: Sola Scriptura (Somente a Escritura/Bíblia). Sola Gratia (Somente a Graça) e Sola Fide (Somente a Fé). Cremos que as Escrituras são plenamente inspiradas por Deus e constituem nossa única fonte e norma de fé. A salvação em Cristo dá-se pela graça e mediante a fé (Ef 2.8-9).

A premissa “Somente a Escritura” nos previne contra doutrinas que se fundamentam em opiniões e tradições humanas. Tanto a teologia romana, que se baseia e confia na palavra e nas bulas papais, como também a teologia pentecostal que se fundamenta autoridade em pessoas que supostamente receberam revelações, acabam, muitas vezes, se desviando da palavra de Jesus expressa e centralizada nas Escrituras.

É histórico que, ao logo do tempo, muitos papas, independente de serem mais conservadores ou mais progressistas, se desviaram das Escrituras, decretando vários ensinos contraditórios e opostos a Bíblia: purgatório, tesouro da igreja formada pelo superávit de obras de alguns, adoração aos santos, o purgatório e a famosa busca de lucro pela venda de indulgências, onde o livramento das almas do purgatório era comercializado. O comércio de indulgências aconteceu em diferentes épocas, mas curiosamente foi intensificada no século XVI, com o evidente objetivo de conseguir dinheiro para a construção daquela grande construção para a qual o mundo dirigiu seus olhos durante esse último conclave – a basílica de São Pedro. Aliás, foi um outro papa com o título de Leão, chamado Leão X, contemporâneo de Lutero, que emitiu bulas fomentando esse comércio através de um grande marqueteiro da época, chamado Johann Tetzel.

Atualmente há uma guerra nas taxações de produtos. A China e os Estados Unidos são protagonistas. Na Idade Média, taxações das famílias dos “Médices” e dos “Fugger”, patrocinavam imperados e o clero. Cargos de cardeais foram comercializados, literalmente vendidos, prática conhecida pelo nome de simonia, provinda do nome de Simão, o Mágico (ver At 8.8-24).

Nós, luteranos, exultamos quando o líder da igreja do Vaticano, permanece humilde e subordinado a Jesus, pelas Escrituras. Por isso nossa palavra não é a favor ou contra esse ou aquele papa, mas somos contrários a formulação da instituição do papado, pois várias vezes usurpou o lugar de Deus (2Ts 2.4); e várias vezes distanciou-se da Escritura por interesses humanos.

Enquanto a Igreja romana se apegou ao relativismo das vontades humanas, há um outro grupo, que em sua época Lutero chamou de entusiastas, que se autodenominam iluminados pelo Espírito a despeito das Escrituras. O pregador mirim (Miguel), assim como outros de nossa época, se assemelham aos entusiastas do século XVI, pois evocam uma autoridade em si mesmos, proclamam prosperidade, constroem igreja próprias e ditam regras e ritos inventados por eles mesmos. Saem gritando: “Está amarrado… Eu declaro isso e aquilo… ou Of the King, the power, the best”. Ou seja; têm uma similaridade com os vendedores de indulgências, porém, ao invés de estarem alicerçados em bulas papais, estão alicerçados no ministério do fulano ou do ciclano, uma autoridade própria! Assim, em nome da prosperidade, esquecem a cruz, ocultam Jesus e rejeitam a Pedra Angular!

Toda vez que um discurso religioso é feito, distante da firme e eterna palavra de Jesus, há uma casa sendo construída sobre a areia. (Mt 7.26-27). Todo aquele que ouve (ou lê) a Palavra de Deus, e a pratica (ensina e vive segundo ela), é semelhante a um homem que construiu a sua casa sobre a pedra (Mt 7.24). Essa pedra é Cristo (Ef 2.20).

Reconhecemos o papa como líder dessa denominação com sede no Vaticano. Porém não reconhecemos como o cabeça da Igreja. Pois Jesus é o Cabeça (Cl 1.18). Não reconhecemos como pedra angular. A pedra angular é Jesus (Ef 2.20-22)! Não reconhecemos documentos e decisões contrárias a Palavra de Deus. Também denunciamos que, assim como o sumo sacerdote da época de Jesus, Caifás, e os lideres fariseus rejeitaram a pedra angular (At 4.11); também o Vaticano a rejeita pela maneira como estabelece a instituição papal. Consideramos um erro de interpretação usar Mateus 16.13-20 para considerar a “pessoa de Pedro” a pedra sobre a qual Cristo edificou a Igreja. Entendemos que a pedra não é a pessoa de Pedro, mas a confissão de Pedro. Isto é, a resposta de Pedro escrita em Mateus 16.16 que diz: “O Senhor é o Cristo, o filho do Deus Vivo”.

Quando Jesus disse: “sobre ESTA pedra edificarei a minha Igreja” (v.18) o referente do pronome demonstrativo (ESTA) é a resposta que Pedro deu e não a pessoa de Pedro. No texto original, em grego, isso fica ainda mais evidente! Menciono o texto de Mateus capítulo 16 porque é a base da instituição do papa como substituto de Pedro.

A confissão de Pedro (Mt 16.16), é o resumo da Escritura, o centro da Palavra de Deus. Jesus é o Cristo Salvador, prometido pelo Antigo Testamento. Deus criou o mundo por meio do Verbo (Palavra) e edificou sua Igreja sobre esta mesma Palavra. Jesus é o verbo que se fez carne. Jesus é a Palavra que se fez gente (Jo 1.14). Em resumo, Jesus é a Pedra Angular rejeitada pela aristocracia sacerdotal de sua época, liderada por Caifás, e rejeitada ainda hoje! Jesus é o caminho, a verdade e a vida. Ninguém vai ao Pai senão por meio dele (Jo 14.6).

Nossos pilares e nossos solas (Sola Scriptura, Sola fide e Sola Gratia), se unem e apontam para um outro Sola. SOMENTE CRISTO! Toda honra e glória a Ele, o único e suficiente Salvador!

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